O Vasco da Gama atravessa um dos momentos mais vexatórios e dolorosos de sua história recente. A derrota por 4 x 0 para o Independiente Del Valle, em Quito, escancarou um time desorganizado, entregue e incapaz de oferecer qualquer resistência mínima a um adversário tecnicamente superior, mas nem de longe intransponível. O que se viu em campo foi um massacre, posse de bola de 80% para o time equatoriano, uma estatística que não apenas expõe o domínio, mas revela o completo colapso tático e anímico do clube cruzmaltino. Um time morto, sem alma, sem estratégia e, pior ainda, sem vergonha.
O vexame só não foi maior porque o goleiro Léo Jardim defendeu um pênalti nos acréscimos do segundo tempo, evitando que o placar se transformasse em um 5 x 0 mais contundente ainda. O Vasco foi completamente dominado do início ao fim e ainda teve o lateral Lucas Piton expulso antes dos 15 minutos da etapa inicial, tornando a tragédia ainda mais previsível e inevitável.
Esse desastre internacional veio logo após outra atuação medíocre no clássico contra o Botafogo, quando o Vasco perdeu por 2 x 0 no Estádio Mané Garrincha, em Brasília, sem esboçar grande competitividade. Foi um jogo em que o rival sequer precisou acelerar o ritmo. O Vasco, apático, desinteressado e desconectado da realidade, parecia disputar um amistoso de pré-temporada, quando na verdade briga desesperadamente para não afundar ainda mais na crise que já se arrasta há quase oito anos.
A torcida, como sempre, é a única que ainda resiste. Mas resiste cansada, exaurida, ferida. Desde a gestão de Alexandre Campello, passando pela gestão Salgado e agora com Pedrinho à frente, o que se assiste é um roteiro contínuo de desmandos, promessas vazias, ausência de planejamento e uma gestão que flerta com o amadorismo em todos os sentidos. Pedrinho, que chegou à presidência sob um tsunami de esperança por parte da torcida, transformou-se em uma das maiores decepções recentes. Sua gestão é marcada por omissão, falta de pulso, ausência de liderança, comunicação caótica e um absoluto despreparo para gerir uma instituição da grandeza do Club de Regatas Vasco da Gama. O torcedor que sonhou com um Vasco de volta ao protagonismo, hoje vê um clube à deriva, abandonado e entregue a interesses que em nada se conectam com o que representa a camisa cruzmaltina.
O time ficou exatos 30 dias sem disputar uma partida oficial, entre 12 de junho e 12 de julho. Durante esse período, o Vasco retornou aos treinos apenas no dia 23 de junho. Foram quase três semanas para reorganizar o elenco, recuperar o físico e planejar um segundo semestre minimamente decente. O que se viu no retorno aos gramados, porém, foi um time apático, pesado, desorganizado, sem competitividade e completamente perdido em campo. A tal “intertemporada” promissora foi apenas mais uma ilusão vendida à torcida, que outra vez acreditou, e novamente decepcionou-se.
Para piorar, a diretoria trouxe apenas um reforço na janela, até aqui, o volante Thiago Mendes, que chega longe do auge físico e técnico. O novo diretor executivo de futebol, Admar Lopes, até agora nada entregou. Um profissional cercado de dúvidas por onde passou (na função que atualmente exerce) terá de se mexer rápido para apresentar nomes e resultados. A política de contratações no Vasco tem parecido desorientada, insensata, normalmente desconectada da realidade esportiva do clube.
E no centro de todo esse colapso está uma farsa institucionalizada chamada SAF. A torcida do Vasco foi enganada de maneira covarde, manipulada por discursos mentirosos que vendiam a Sociedade Anônima do Futebol como a salvação, como a profissionalização, como a fórmula mágica para transformar o clube em potência. Prometeram que o Vasco voltaria ao topo, que teria estrutura, inteligência, competitividade, transparência. O que se viu foi o contrário. A SAF imposta pela 777 Partners foi um dos maiores crimes institucionais cometidos contra o Vasco. Uma empresa sem plano, sem comando, sem compromisso, que tratou o clube como ativo financeiro de baixo custo, e não como instituição esportiva. Jogaram com a paixão do torcedor como se estivessem operando na Bolsa de Valores. Usaram o Vasco, sugaram o que podiam e saíram deixando um rastro de fracasso.
A SAF não profissionalizou o clube, ela blindou a incompetência. Não trouxe transparência, ela reforçou a escuridão. Não atraiu grandes investimentos, ela apenas criou novas formas de escoar dinheiro sem retorno técnico. O torcedor foi manipulado, tratado como consumidor ignorante, alvo fácil para narrativas de PowerPoint e falas ensaiadas. Mentiram, esconderam a verdade, prometeram o impossível e entregaram o caos. A gestão da SAF foi tão desastrosa quanto as gestões associativas de 2018 em diante, e talvez até mais nociva, porque veio com a chancela de seriedade e modernidade, quando na prática era apenas mais um projeto podre, travestido de solução.
O Vasco caminha a passos largos para completar mais um ano sem títulos (o nono ano). Nesse período de vexames sucessivos, rebaixamentos, mautenção na segunda divisão, eliminações precoces, goleadas e escândalos institucionais. São nove anos sendo chacota até de adversários menores. O que era para ser a manutenção de uma reconstrução que se via, com o Vasco classificado à Libertadores, dívida reduzida no triênio 2015/2017, superioridade no confronto direto frente aos rivais, conquistas no triênio de mais títulos e/ou taças oficiais que todos os outrso grandes do Rio (juntos), recuperação patriminial e da base, virou terra arrasada. O clube esteve e está completamente desgovernado, arrastado por interesses menores dirigido por pseudos profissionais e usado como moeda política por gente que nem sequer entende o significado, em gerindo, de carregar o peso dessa camisa.
Nos últimos sete anos e meio o Vasco foi e é tocado por pessoas que não compreendem a responsabilidade de conduzir uma instituição centenária, popular e histórica. O clube virou vitrine para vaidades, trampolim para carreiristas e laboratório de experiências fracassadas. A marca Vasco tem sido explorada como se fosse uma laranja espremida até o bagaço. Não há transparência, não há comprometimento, não há respeito à história do clube.
O torcedor, esse sim, segue firme, mas completamente perdido. Apegado à paixão, já não sabe mais no que acreditar. Mentiras repetidas se tornam verdades em um ambiente de desespero emocional. O amor pelo clube virou uma prisão afetiva. E mesmo cansado, machucado e decepcionado, o vascaíno segue ali, mas não sabe como chegar onde deseja e repete os desejos daqueles que lhe venderam soluções e saídas únicas, tamponando sua própria incapacidade ou vontade de achar caminhos outros, porque dá muito trabalho.
O Vasco precisa de uma ruptura imediata com esse ciclo de incompetência. Precisa de gente séria, capacitada e comprometida com a reconstrução do clube. Chega de omissão, de promessas vazias, de vexames intermitentes. Acordar é urgente, porque o Vasco, gigante por natureza, posta-se há 90 meses do tamanho de seus dirigentes. E isso resume sucessivos fracassos e desculpas.
Tiago Scaffo