Futebol

Na saúde e na doença (uma história de amor ao clube)

O e-mail caiu na minha caixa-postal na terça-feira, relatando uma conversa que aconteceu na semana passada, num apartamento em São Paulo. O vascaíno, angustiado com a situação do time às vésperas do clássico contra o Fluminense, revelou à mulher uma decisão importante: – Preciso ir ao Rio neste fim de semana.

– Mas por que, amor? Já vamos na semana que vem para um aniversário.

– Preciso ir ao Rio, preciso ver o jogo.

– Precisa mesmo? – Sim, você se importa? – Se você precisa, então vai lá.

– Preciso. Preciso estar lá para ajudar o Vasco a ganhar. Se não ganhar, preciso estar lá para cair junto com ele e lhe dar a mão para começar a levantar. Preciso muito ir a esse jogo. É uma prova de esperança, uma prova de amor. Eu preciso estar lá. Você se importa? – Não, pode ir.

Se você não tem, na vida, uma cena parecida para contar, não perca o tempo de ler essa coluna até o fim. Será inútil.

Se tem, aceite o convite para lembrar, e celebrar, a paixão pelo futebol. Não importa qual seja o seu time, só que você tenha um. Aquele distintivo é parte integrante do que somos, e não podemos ser compreendidos separadamente.

Ainda que o poder destrutivo do ser humano seja infinito como sua capacidade de criar. Ainda que existam cartolas inescrupulosos, gerentes de futebol muito mais bem remunerados do que se imagina, jogadores que não passam perto da noção do significado da camisa que vestem, bagrecéfalos que insistem em confundir uniformes com roupas camufladas.

Quanto mais atrasada a sociedade, mais feio é o cenário em seus estádios de futebol. Por aqui, a seis anos da Copa do Mundo, os nossos continuam distantes de oferecer um tratamento minimamente decente. Freqüentá-los é puro masoquismo, na esmagadora maioria dos casos.

Só que o campo magnético em torno deles tem uma força tamanha, que continua nos atraindo semana após semana. A ponto do vascaíno em questão deixar a família em São Paulo, e atravessar a Via Dutra, duas vezes, para ver o time dele jogar.

Mas e se o time perder? Você sabe como isso funciona. Mesmo em caso de arrependimento momentâneo, a decisão de não repetir a aventura duraria pouco.

Bastaria que o coração pedisse, e não precisaria insistir muito.

Mas, como se sabe, o chute deWagner Diniz passou por baixo de Fernando Henrique. O Vasco venceu, e ainda tem pulso no campeonato.

E para melhorar a história, o email conta como foi a chegada em casa: – Bom dia! – Oi...

– Cansado? – Sim.

– Feliz? – Muito.

Então valeu a pena, né? Assim o vascaíno encerra: “Um sorriso, um silêncio, um abraço, a compreensão, e a lágrima escapando pelo canto do olho. Sou mesmo um cara de muita sorte”.

Sem dúvida, vascaíno.

E você, que sabe como são essas coisas, também é. Não se trata de comparar amores, escolher o que é mais importante. Mesmo porque, entre família e futebol, não deve haver comparação.

A sorte vem da felicíssima reunião de sentimentos. Da oportunidade de se dar o luxo de brindar ao indissolúvel casamento entre torcedor e time.

O que a bola uniu, o homem não separa.


TRÊS TOQUES

Humoristas
Carlos Eugênio Simon apitou Avaí x Ponte Preta, pela Série B, na noite de sextafeira passada. Na tarde de domingo, estava no Maracanã, apitando Fluminense x Vasco, pela Série A. Será que ele estava nas melhores condições físicas para trabalhar no clássico? Mistérios da mesma escala de árbitros que determinou que Marcelo de Lima Henrique, juiz do “jogo do chororô” (Taça Guanabara 08), apitará Botafogo x Flamengo, amanhã.

André Kfouri

Fonte: Lance!