Não foi exatamente um grande jogo. Mas teve cara dos grandes duelos entre Flamengo e Vasco nos anos 70 e 80. Tensão por todos os cantos do estádio nas aquibancadas, cadeiras e gramado. Equilíbrio com alterações no comportamento das equipes. A cada 10 minutos, o roteiro mudava. Às vezes, os rubro-negros eram melhores. O relógio corria e os vascaínos assumiam o domínio. O clássico trocava de cara a todo momento. Terminou o tempo normal com o Flamengo na pressão e com o Vasco dando sinais de instabilidade física e emocional. Mas, no geral, o duelo foi bem igual. Nos muitos erros, no excesso de vontade e nos poucos acertos.
E a decisão da Taça Rio foi para a marca do cal. E ali, na frieza das penalidades, o torcedor, entusiasmado com o título ou machucado com a derrota, pode escolher pela explicação que lhe for mais conveniente. No fim, o mesmo filme das semifinais da Taça GB e da Taça Rio do Cariocão-2011: na tortura das cobranças de pênalti, o Fla voltou a ser mais certeiro, racional, concentrado e
campeão estadual pela 32ª em sua história.
O torcedor rubro-negro dirá que o Fla venceu porque seus cobradores foram mais competentes (com exceção da ida de Fierro à lua) e que os adversários respeitaram demais a presença de Felipe, emérito pegador de pênaltis. Foi assim contra o Botafogo (semifinal da Taça GB), contra o Flu (semifinal da Taça Rio) e hoje contra o Vasco (na decisão do mesmo segundo turno). Só que desta vez Felipe não precisou fazer nenhuma defesa. Das quatro cobranças cruzmaltinas, só Alecsandro (que não chegou a bater bem) converteu. Bernardo, Felipe Bastos e Elton chutaram o sonho do Vasco pela linha de fundo. E aí vem o veredicto lá de São Januário: quem perdeu o título foi o Vasco, e não o arqui-rival que venceu.
Tudo questão de retórica. De fato, o Fla não foi um grande time no Estadual. Mas, reparem, não perdeu. Pela quinta vez na história, termina uma campanha como campeão invicto. Ou seja, oscilou em vários momentos, mas assim mesmo seus adversários não souberam vencê-lo. E, na letra fria das cobranças de pênaltis, que estava prevista no regulamento do Estadual, o Fla, com ou sem as defesas de Felipe, soube se impor. Ah, dirão os rivais, mas eles não ganharam nenhum clássico ou jogo decisivo nas semifinais ou mesmo na final da Taça Rio!. Sim, é fato. Mas, vem o contra-argumento da Gávea: e quem venceu? A solidão dos pênaltis foi oferecida para todos os grandes do Rio e só os rubro-negros souberam aproveitá-la.
Por isso, apenas por isso, e pela maior regularidade na campanha, entendo que o título foi merecido. Claro que o Fla deve comemorar. A festa e as provocações são mais do que válidas. Porém, que fique o alerta. Há muito a ser corrigido e turbinado para o Brasileirão-2011 e até mesmo para a reta final da Copa do Brasil. Falta um zagueiro (Wellinton é pouco), um centroavante e um lateral-esquerdo. Falta Ronaldinho Gaúcho voltar a ser protagonista (conseguirá?). Na conquista do estadual, as estrelas foram Felipe, Thiago Neves e o incansável Willians, expulso, com Allan, no fim do clássico. Luxemburgo sabe das necessidades e tentará corrigi-las. Com um título na bagagem, haverá mais tranquilidade para acertar esses detalhes nos próximos dois meses. Não dá para esperar mais.
Quanto ao Vasco, que a perda do Estadual não se transforme em depressão. Por incrível que pareça, o clube tem mais a comemorar do que lamentar. Saiu de uma campanha patética na Taça GB para um recuperação elogiável na Taça Rio, com o melhor time montado desde 2002. Perdeu o título nos pênaltis. Mas tem um grupo ajustado e quase definido para o que vem pela frente. Está firme na disputa da Copa do Brasil e há muito não começava tão forte num Brasileirão. Que todo trabalho de recuperação, desenvolvido por Ricardo Gomes, pela diretoria e pelos próprios jogadores, não seja jogado no lixo por conta de um tropeço. Desagradável, mas que faz parte do jogo.
Enfim, um Cariocão bem mais ou menos e que, do início ao fim, teimou de ser resolvido nas penalidades. E, nesse ponto, não há polêmica a ser alimentada. Fla terminou invicto no tempo normal e nas penalidades. Com todo respeito, não há como negar o merecimento na conquista.